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O Calvinismo e a graça comum

No pensamento calvinista, tudo que é verdadeiro, bom e belo no homem tem procedência da graça de Deus. O homem, mesmo sendo pecador, não está inteira e absolutamente privado da graça de Deus, ou sua graça comum. Calvino diz que há momentos de verdade em todos os homens, mesmo na condição de pecador. Ele escreve:
Quantas vezes, pois, entramos em contato com escritores profanos, somos advertidos por essa luz da verdade que neles esplende admirável, de que a mente do homem, quanto possível decaída e pervertida de sua integridade, no entanto é ainda agora vestida e adornada de excelentes dons divinos. Se reputarmos ser o Espírito de Deus a fonte única da verdade, a própria verdade, onde quer que ela apareça, não a rejeitaremos, nem a desprezaremos, a menos que queiramos ser insultuosos para com o Espírito de Deus. Ora, nem se menosprezam os dons do Espírito sem desprezar-se e afrontar-se ao próprio Espírito[1].
Em contraste com a gratia particularis, que é a manifestação da graça especial de Deus para a salvação de seus escolhidos, a gratia communis, ou graça comum, são as bênçãos que Deus derrama sobre os justos e injustos, santos e pecadores, sem distinção, por causa de sua infinita bondade, como está escrito no evangelho de Mateus 5:45: “para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos”. Estão bênçãos são, não apenas gerais como o sol e a chuva, mas são tudo aquilo que reflete o caráter bom, justo e perfeito de Deus no homem decaído. A graça comum, é definida pelo teólogo Wayne Grudem como “a graça pela qual Ele (Deus) dá as pessoas inumeráveis bênçãos que não fazem parte da salvação[2]”. Já Louis Berkhof define a graça comum de Deus como:
(a) as operações d Espirito Santo pelas quais ele, sem renovar o coração, exerce tal influência sobre o homem por meio de sua revelação geral ou especial, que o pecado sofre restrição, a ordem é mantida na vida social, e a justiça civil é promovida. Ou (b) as bênçãos gerais, como a chuva e o sol, água e alimento, roupa e abrigo, que Deus dá a todos os homens indiscriminadamente, onde e quanto Lhe parece bom fazê-lo[3]
Em outras palavras, a graça comum de Deus age tanto negativamente, restringindo a influência do pecado, quanto positivamente, promovendo a justiça cívica e derramando as bênçãos de Deus sobre os homens. No aspecto positivo da manifestação da graça comum, compreende-se o desenvolvimento histórico e cultural da humanidade. Devido ao refreamento do pecado, pela graça comum, como explica Anthony Hoekema, a cultura e a civilização são possíveis. Ele disse: “a doutrina da graça comum nos ajuda a explicar a possibilidade da civilização e cultura nesta terra a despeito da condição decaída do homem[4]”. Henry Van Til, em seu livro O Conceito Calvinista de Cultura, afirma: “a cultura é um dom da graça comum já que, por meio dela, os poderes originais depositados na natureza vieram a fruição[5]”.

Em contrapartida, Antony Hoekema também alerta para o perigo de usar erroneamente esta doutrina. Ele diz que “a fé na graça comum poderia ser usada como pretexto para amenizar a antítese entre uma visão cristã da vida e do mundo e uma não-cristã, ou como uma desculpa para um conduta duvidosa ou mundana[6]”. Infelizmente isso é verdade em alguns pensamentos. Não se pode conceber a graça comum, como afirma Van Til, por um “otimismo cultural falso e a glorificação do homem natural e de sua realização[7]”. Esta não é a proposta da visão calvinista.

No entanto, ao defender a doutrina da graça comum, reconhece-se a verdade de que, por mais corrompido pelo pecado que o homem seja, e alienado de Deus que ele esteja, ainda assim Deus continua brilhando sua luz sobre o homem, mesma que seja uma imagem morta de Deus. E desta forma, não se pode negar que a graça de Deus, de forma geral e comum a todos os homens, está presente em cada faceta da cultura do homens promovendo o justo, o bom e o belo, refletindo assim a glória de Deus.


Citacões:
[1] Intitulas, II.2.15
[2] Wayne Grudem – Teologia Sistemática, pg. 549
[3] Berkhof, Teologia Sistemática, pg. 437
[4] Hoekema, Criados a Imagem de Deus, pg.220
[5] Van Til, O Conceito Calvinista de Cultura, pg.271
[6] Hoekema, ibidem
[7] Van Til, Ibidem, pg. 283

4 Deixe aqui seu comentário::

Weliton Borges disse...

Porque citar Mt 4:45 como graça comum se este cuidado de Deus é uma clara manifestação da providência de Deus.

A doutrina da graça comum não aparece em Calvino e nem nos padrões de Westminster, na realidade essa doutrina é uma criação do Kuyper que tem em sua base problemas como "Redenção da Cultura" e "Regeneração presumida".

Essa doutrina é realmente uma doutrina reformada segundo os padrões de westminster?

olha o que diz o catecismo maior:

18. Quais são as obras da providência de Deus?

As obras da providência de Deus são a sua mui santa, sábia e poderosa maneira de preservar e governar todas as suas criaturas e todas as suas ações, para a sua própria glória.

Lev. 21:8; Sal. 104:24: Isa. 92:29; Ne. 9:6; Heb. 1:3; Sal. 103:19; Mat. 10:29-30; Gen. 45:7; Rom. 11:36; Isa. 63:14.

Luis Carlos disse...

Querido Weliton, obrigado pelo seu comentário!
O texto de Mateus 5:45, e não 4:45, fala do cuidado de Deus e de seu favor dispensado sobre toda a humanidade, como o texto diz, sobre os bons e os maus. Este favor de Deus não pode se limitar apenas a bençãos gerais, como a chuva e o sol, do contrário, você limitaria Deus.

Realmente, Calvino não desenvolveu a doutrina da graça comum, mas em seus escritos vemos de forma clara que ele também não nega a doutrina. Como foi citado no texto Calvino defendia que tudo que é bom, belo e verdadeiro no homem procede de Deus, e isso você e ninguém pode negar. Vou repetir o que ele disse: "Se reputarmos ser o Espírito de Deus a fonte única da verdade, a própria verdade, onde quer que ela apareça, não a rejeitaremos, nem a desprezaremos, a menos que queiramos ser insultuosos para com o Espírito de Deus. Ora, nem se menosprezam os dons do Espírito sem desprezar-se e afrontar-se ao próprio Espírito"

Só para sua informação, Kuyper realmente foi o que primeiro sistematizou a doutrina da graça comum, mas ela também foi defendida por outro grande teologo e filósofo cristão,Herman Bavinck.

Discordo de sua afirmação que a graça comum tem em sua base a "Redenção da Cultura" e "Regeneração presumida". Acredito que você esteja bebendo em fonte estranha, meu amigo. Antes, a Graça comum afirma justamente o que você começou a dizer mas sem considerar todas as implicações. Se Deus governa sobre tudo e todos por meio de sua providência, não podemos afirmar que este governo seja apenas na restrição do pecado. Este governo também se manifesta na operação do bem, no desenvolvimento cultural, como parte do mandato cultural conferido ao homem.
Abraços Weliton e leia mais um pouco!

Weliton Borges disse...

Com certeza li muito menos que o senhor, mas segue um link que creio ser interessante. Ele me fez repensar as bases bíblicas para a doutrina da graça comum que ante eu defendia.

http://issuu.com/heraldoa/docs/neocalvinismo

danielle oliveira disse...

Olá boa tarde, sou de campo grande ms, estou fazendo meu tcc com o tem agraça poderia me dar uma ajuda? tem skype, whatz ou fb?
Me chamo danielle Olivera.

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